quinta-feira, 10 de abril de 2008

A arte de falar mais que a boca

Existem pessoas que falam pelos cotovelos, que falam mais que o homem da cobra, que engoliram o rádio... e existem aquelas pessoas que falam mais que boca.
Falar mais que a boca é um dom que transcende a estrutura nervosa do corpo e atinge estágios de total sublimação do ser, que perde a consciência de seus atos e passa a se comunicar por toda a qualquer coisa que lhe permita contato com o mundo. O ente que fala mais que a boca é facilmente reconhecido: ombros tensos, mãos inquietas, lábios auto-destruidores e extrema habilidade para arrumar sarna para se coçar. Todo falante mais que a boca tem a incrível capacidade de se meter em confusões de diversas ordens através de seus órgãos comunicadores, ou não, que ao final e ao cabo, não são culpados de coisas alguma.
É aqui que entendemos a patologia do falar mais que boca. Comunicar é algo inato a todos os seres da terra e, em especial, os humanos. Apesar de possuirem um completo aparelho fonador, a linguagem verbal e não-verbal, nós homo sapiens sapiens utilizamos também aqueles meios que inventamos, tais como o telefone, o jornal, o rádio, a TV, a internet...etc. Assim potencializamos nossa capacidade de nos comunicar o tempo todo e mantemos sempre aberta nosso canal com a sociedade, com qual podemos sempre comentar qualquer coisa. Tudo com a finalidade de nunca ficar sem assunto e portanto nunca ficar sozinho consigo mesmo. Trata-se da vertigem do homem pós-moderno - o medo de ficar sozinho. E é daí que surgem os seres que falam mais que boca!
Joseph Conrad no começo do século passado escreveu:"We live as we dream: alone". Essa constatação arrebatou o homem moderno e pós-moderno de tal forma que até hoje buscamos meios de negar essa máxima. Existe a fobia de estar sempre em contato com algo ou alguém, mas nunca sozinho. Assim não fosse, o próprio Conrad poderia ter deixado suas idéias para si mesmo e não ter publicado coisa alguma!
A síndrome do falar mais que a boca é, portanto, uma patologia da vida pós-moderna, dentre tantas outras existentes. Traz consigo variações e variantes, como a síndrome do dedo-duro, a síndrome do boca-aberta, a síndrome do sarnento...entre outras. Mas aí é outra história.

Nenhum comentário: